segunda-feira, 25 de julho de 2016

DO ILUMINISMO ÀS TREVAS
Jeremias Macário

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Com nomes de destaque nacional e internacional na música, nas artes plásticas, no teatro, na poesia, na literatura, no cinema e outras áreas do conhecimento humano, a Bahia já foi um grande celeiro de criações artísticas e de projetos que alavancaram o desenvolvimento cultural e científico do Estado.

Arrisco a dizer que as décadas mais recentes de 40, 50, 60 e até 70 do século passado foram efervescente e representaram a era do iluminismo baiano que depois foi cedendo lugar às trevas das ideias e dos pensamentos consumistas de interesses puramente comerciais.
  Diferente dos tempos passados renascentistas, hoje o criador, na sua grande maioria, ao elaborar qualquer projeto ou obra artística pensa logo se está alinhado ao que o mercado quer e pede. Caso contrário, seu trabalho não sobreviverá à ditadura do mercantilismo capitalista e da patrulha ideológica.
Quando resolvi abordar o tema “do iluminismo às trevas” confesso que me veio à mente as produções musicais das décadas passadas em referência com as da atualidade com suas letras de baixo nível, principalmente a partir dos arrastões carnavalescos da chamada era do “axé music”que está mais para a existência do caos.
 Vários outros segmentos da nossa cultura popular e acadêmica também se chafurdaram pelos vícios dessa produção desprezível. Nisso, algumas tradições culturais, lamentavelmente, vivem processo de extinção, como é o caso das nossas seculares festas juninas que não são mais as mesmas por causa das misturas nefastase babélicas de outros estilos exóticos e alienígenas, cujos representantes insistem argumentar que as mudanças são necessárias porque estamos em outros tempos.
Vivemos períodos duros da ditadura militar quando as pessoas letradas, mesmo oprimidas e amordaçadas, ainda colhiam os frutos do aprendizado revolucionário educacional e cultural das décadas de 50 e 60. Aquela gente ainda tinha o gosto e o prazer de ler, pesquisar e estudar. Não aceitavam pacotes vazios cheios de papéis picados e inúteis. O que temos hoje é um bando de sofistas e surfistas.

A regressão do ensino a partir do final da década de 70 se acentuou com a redemocratização e aí, a liberdade de expressão por si só, não foi antídoto imunológico suficiente para eliminar o vírus devastador das ideias oportunistas mercadológicas. Tornamo-nos exímios consumidores de uma sopa de embalagens bonitinhas por fora e ordinárias por dentro. Tempos de Sodoma e Gomorra!
  No caso específico da Bahia, que pode também servir de exemplo para todo Brasil, o inverso aconteceu com a redemocratização a partir de 1946 em que se deu a vitória sobre o nazi fascismo e o Estado Novo. Sem contar Ruy Barbosa e outros nomes de peso entre final do século XIX (República) e início do século XX, uma safra de grandes intelectuais,como Anísio Teixeira, Nestor Duarte e outros, começou a ser colhida a partir do Governo de Octávio Mangabeira.
A autoestima dos baianos foi por assim dizer restaurada com a criação da Universidade Federal da Bahia (UFBA), em 1946, onde o reitor Edgar Santos deu novo impulso à cultura, embora já existissem movimentos de vanguarda na literatura, na educação e nas artes em geral.
A implantação da Petrobrás imprimiu novo conceito moderno de industrialização na Bahia, e as décadas de 50 e 60 bombaram na música, na dança e no teatro. Por outro lado, o ensino público desde o primário ao clássico e científico era referência em qualidade e conteúdo, tendo como exemplo maior o Colégio Central da Bahia, em Salvador. 
  O iluminismo progrediu mais ainda com a chegada do Cinema Novo de Roberto Pires, Walter da Silveira, Glauber Rocha e a Tropicália dos Novos Baianos com Caetano, Gilberto Gil, Morais Moreira, Tom Zé, Gal Costa, Pepeu, Bebe Consuelo e tantos outros, sem deixar de esquecer as obras autorais e filosóficas de protesto do nosso grande Raul Seixas.
  Jorge Amado, Hélio Pólvora, Euclides Neto,Adonias Filho, Antônio Torres, Thales de Azevedo, Afrânio Peixoto, Milton Santos, Theodoro Sampaio, Osório Alves Castro, Calasans Neto, Mário Cravo Júnior, Juarez Paraíso, Sósigenes Costa, Afonso Manta, Camilo de Jesus Lima, Florisvaldo Mattos, Fernando da Rocha Peres e outros literatos, poetas e pintores propagaram o nome da Bahia e do Brasil lá fora, ultrapassando nossas fronteiras.
 Na área do planejamento econômico e científico contamos com as ideias renovadoras de Rômulo Almeida, José de Freitas Mascarenhas e Roberto Santos que contribuíram em muito para a consolidação do Polo Petroquímico de Camaçari, além da criação de instituições de fomento ao desenvolvimento, como do Desenbanco.
  Com o retrocesso no ensino médio e superior, a música por ser a arte que mais diretamente reflete os sentimentos populares, foi a mais afetada pelo obscurantismo de suas letras reféns de um mercado imediatista, alimentado pelos shows business da cultura artificial norte-americana.
 A ordem foi logo tirar o pé do chão e pular aos gritos e grunhidos dos barulhos ensurdecedores. No ritmo do rebolado dos quadris e dos bumbuns expostos nos palcos e nos trios elétricos, os súditos imitam seus reis e rainhas como ídolos imortais. Não importa o que eles falam de barbaridades!Como disse o filósofo alemão Friedrich Nietzsche, “Tudo é precioso para aquele que foi, por muito tempo, privado de tudo”.
  Quando Dodô e Osmar inventaram da sua fóbica o trio elétrico e a guitarra baiana, não imaginavamque o movimento tomasse o rumo das trevas com tantas “composições” musicais de baixo nível, apelativas, sem conexão e pobres no enredo de suas letras. Aliás, a maioria é desprovida de enredo. O pior é que chamam a tudo isso de péssimo gosto de canções poéticas!
  O povo bem que gostaria de ter coisa boa, mas como só oferecem porcarias, se esbaldam nas danças frenéticas dos axés das Ivetes, dos Bels Marques, das Claudias Leites e dos romantismos melosos e fulos dos arrochas, dos pagodes e dos sertanejos que nada têm de raízes autênticas que falam da vida, da terra, do amor verdadeiro, da nossa história cultural, política e social. A prova é tanto que as praças se enchem para ouvir o som de uma orquestra afinada ou dos grandes artistas que tornaram suas obras eternas, sem apelações comerciais.
  O que temos hoje é uma Bahia deformada e maltratada moralmente que trai sua tradição cultural como no último circo armado na Barra com o show de fogos de artifício onde Ivete Sangalo homenageou Lampião e Maria Bonita em seu “espetáculo junino”. Logo vão elevar Beira Mar e os corruptos da Operação Lava Jato ao status de heróis.
  Enquanto as festas dos carnavais, da entrada de ano e aniversário da cidade, copiando o esquema do avô ACM, duram semanas com grande parte dos recursos bancados pelo estado e pela prefeitura, a Orquestra Sinfônica da Bahia, o Balé Castro Alves, o patrimônio histórico e outras instituições culturais estão ameaçados de extinção por falta de verba. Nos seus 33 anos de história, a Orquestra Sinfônica da Bahia, por exemplo, atravessa o seu momento mais crítico. Faltam músicos e instrumentos.
  Por fim,gostaria de externar que a Bahia não é só um território afrodescendente como focalizam certos movimentos. A Bahia é também um caldeirão de etnias de procedência árabe, de judeus novos-cristãos que povoaram nossa região, de visigodos, de bárbaros, de celtas e de outras descendências europeias, inclusive a portuguesa, o nosso colonizador mor.

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